Introdução
A categorização de deficiência visual atualmente usada em todo o mundo é baseada na 1ª e 2ª edições da 10ª revisão do Código Internacional de Doenças ( CID ), que deriva do grupo de estudo da OMS em Prevenção de Cegueira que se reuniu em 1972 para criar uma definição padronizada. Isso foi feito para facilitar a coleta de dados populacionais sobre a prevalência de deficiências visuais e cegueira de uma maneira uniforme e comparável. Durante essa reunião , quatro causas principais da perda de visão foram identificadas: Tracoma, Oncocercose, Xeroftalmia e Catarata. Não foram levados em consideração os erros de refração como uma causa das deficiências visuais, quando não da cegueira em si.
Justificativa para a Revisão
Há cinco pontos que determinam a necessidade de uma consideração sobre a revisão da definição e categorização atuais. São eles:
- ( 1 ) A definição das categorias de deficiência visual baseada na “ melhor correção visual possível “
- ( 2 ) A nomenclatura
- ( 3 ) A categorização de cegueira
- ( 4 ) As Inconsistências dentro das subcategorias H 54
- ( 5 ) A resolução do Conselho Internacional de Oftalmologia ( ICO ) para revisão do CID 10
Recomendações da Consultoria da OMS para a “Padronização da Definição de Perda de Visão e Funcionamento Visual“
( 1 ) Definição de deficiência visual e cegueira
A definição atualmente utilizada inclui o termo “ melhor correção visual “ no melhor olho. A metodologia seguida para medição da acuidade visual, particularmente nos estudos populacionais, é o uso de um orifício estenopeico ( “ pin hole “ ) em pacientes cuja visão aparente estar abaixo de um determinado ponto de corte ( atualmente 20/60 ). Muitos estudos recentes mostram que o uso da ” melhor correção visual “ despreza uma grande quantidade de pessoas com deficiência visual, incluindo cegueira, em função de erros de refração não corrigidos, uma ocorrência comum em muitas partes do mundo.
Erros de refração não corrigidos são agora considerados a maior causa de deficiência visual e estimativas estão sendo feitas para calcular as perdas em termos de deficiência ( em anos de vida ) decorrentes dessa causa.
A correção dos erros de refração é uma ação valiosa, sendo uma das prioridades do Grupo de Controle de Doenças do Programa 2020- uma Iniciativa Global para a Eliminação de Cegueira Evitáveis ( Programa Visão 2020, o direito à visão ).
( 2 ) Nomenclatura
O CID atual usa as palavras “ visão subnormal “ para as categorias 1, 2 e 3 das deficiências visuais. Na prática dos cuidados visuais, “ visão subnormal “ tem um significado específico, definido pela OMS, que é o seguinte: “ A pessoa com visão subnormal é aquela que possui uma deficiência da função visual mesmo após tratamento e/ ou correção refrativa, apresentando acuidade visual entre menos de 20/60 e percepção de luz, ou um campo visual inferior a 10 graus de campo visual central, mas que usa sua visão , ou é potencialmente capaz de usá-la para o planejamento e/ ou execução de uma tarefa”.
Por essa definição, pessoas que poderiam se beneficiar de tratamentos de baixa visão estão atualmente categorizados como cegos. Isso levou a erros de cálculos de estimativas de pessoas que necessitam de tratamento para visão subnormal.
( 3 ) Definição de cegueira
A definição atual não faz distinção entre aqueles que possuem cegueira irreversível ( sem percepção de luz ) e aqueles que possuem percepção de luz mais ainda possuem menos de 20/400 no melhor olho. A condução dos pacientes dessas duas categorias é diferente, e uma classificação baseada nessa distinção seria útil.
( 4 ) Inconsistências nas subcategorias H54
As subcategorias do H54 possuem inconsistências quando descrevem “ deficiência visual monocular” e cegueira monocular”; sem que o outro olho tenha que ser necessariamente “ normal “. Para tornar mais claras essas subcategorias se propõe a substituição da tabela atual ( ver abaixo CID 10ª revisão ).
Recomendações
( 1 ) A expressão “ melhor correção “ deve ser substituída por “ apresentada “ em uma definição revisada;
( 2 ) Excluir o termo VISÃO SUBNORMAL da atual definição do CID 10 para que se possa descrever coletivamente as categorias de deficiências visuais 1,2 e 3
( 3 ) Novas categorias como mostradas na Tabela 1 ( revisada )
( 4 ) A nomenclatura das subcategorias H54 devem ser alteradas como descrito abaixo, de acordo com a Proposta de Revisão de categorias.
H54- Deficiência visual incluindo cegueira ( binocular ou monocular )
Nota: Para definição das categorias de deficiência visual veja a tabela abaixo
Exclui: amaurosis figax ( G 45.3 )
H54.0- Cegueira, binocular
Deficiência visual categoria 3, 4 ou 5
H54.1- Deficiência visual grave, binocular
Deficiência visual categoria 2
H54.2- Deficiência visual moderada, binocular
Deficiência visual categoria 1
H54.3- Deficiência visual leve ou sem deficiência, binocular
Deficiência visual categoria 0
H54.4- Cegueira, monocular
Deficiência visual categoria 3, 4 ou 5 em um olho e categoria 0, 1, 2 ou 9 no outro olho
H54.5- Deficiência visual grave, monocular
Deficiência visual categoria 2 em um olho e categoria 0, 1 ou 9 no outro olho
H54.6- Deficiência visual moderada, monocular
Deficiência visual categoria 1 em um olho e categoria 0 ou 9 no outro olho
H54.9- Deficiência visual não especificada ( binocular )
Deficiência visual categoria 9
Nota: a tabela a seguir mostra a Classificação da Severidade de Deficiência Visual recomendada pela Resolução do Conselho Internacional de Oftalmologia ( 2002 ) e as Recomendações da Consultoria da OMS para a “ Padronização da Definição de Perda de Visão e Funcionamento Visual “ ( Setembro de 2003 )
Para a caracterização de deficiência visual para os códigos H54.0 a H 54.3, a acuidade visual deverá ser medida com ambos os olhos abertos COM A CORREÇÃO ÓPTICA UTILIZADA, SE HOUVER. Para a caracterização de deficiência visual para os códigos H54.4 a H54.6, a acuidade visual deverá ser medida monocular ( em um só olho ) com a correção óptica utilizada, se houver. Se a extensão do campo visual for levada em consideração, pacientes que apresentarem, no melhor olho, campo visual central não maior do que 10 graus de raio, devem ser classificados como categoria 3. Para cegueira monocular ( H54.4 ), esse grau de perda de campo visual deve estar presente no olho afetado.
*Ou contagem de Dedos ( CD ) a 1 metro
Nota: O termo deficiência visual na categoria H54 engloba a Categoria 0 para deficiência visual leve ou sem deficiência, Categoria 1 para deficiência visual moderada, Categoria 2 para deficiência visual severa, Categoria 3, 4 e 5 para cegueira e Categoria 9 para deficiência visual indeterminada. O termo “ visão subnormal “ existente na revisão anterior foi substituído pelas categorias 1 e 2 para evitar confusão em relação à classificação daqueles pacientes que necessitam de tratamento para visão subnormal.
Considerações sobre Visão Monocular
Visão monocular é definida como a presença de visão normal em um olho e cegueira no olho contralateral- acuidade visual inferior a 20/400 com a melhor correção visual.
Em 31 de Julho de 2008 ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou o projeto de lei aprovado no Congresso Nacional que caracterizava a visão monocular como deficiência visual. O projeto de Lei da Câmara dos Deputados ( PLC ) nº 28, de 2008, garantia às pessoas que enxergavam apenas de um olho a possibilidade de se beneficiarem das ações governamentais de apoio à integração social do portador de necessidades especiais, bem como afastar as discriminações e os preconceitos de qualquer espécie.
A visão monocular interfere com a estereopsia ( percepção espacial dos objetos ) permitindo examinar a posição e a direção dos objetos dentro do campo da visão humana em um único plano, ou seja, apenas em duas dimensões. Assim, pacientes com visão monocular reconhecem a forma, as cores e o tamanho dos objetos, mas têm dificuldade em avaliar a profundidade e as distâncias, características da visão tridimensional.
Em alguma situações específicas, limitações provocadas pela visão monocular podem interferir no exercício de certas profissões como Motorista Profissional ( caminhão, ônibus e carretas ) e Piloto de avião. O Conselho Nacional de Trânsito ( Contran ), por meio da Resolução nº 80, de 19 de Novembro de 1998, proíbe o exercício de atividade remunerada de condução de veículos automotores para portadores de visão monocular.
Segundo a justificativa presidencial, o enquadramento da visão monocular como deficiência dependeria da acuidade visual do olho único. Além disso , nas razões do veto, a Presidência da República justifica que o projeto de lei, ao dispor sobre a visão monocular individualmente, contraria a tendência buscada de se estabelecer um modelo único de classificação de deficiência, adotado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, que tramita no Congresso Nacional, e pelo Grupo Interministerial criado com o objetivo de avaliar o modelo de classificação e valoração das deficiências utilizado no Brasil.
Ao vetar o projeto de lei, o Executivo mantém o entendimento da Organização Mundial de Saúde sobre Cegueira e sobre Baixa Visão. Por outro lado, Estados, como o Ceará e o Espírito Santo, já sancionaram leis que beneficiam em parte os portadores de visão monocular.
É justa a manutenção dos direitos de aposentadoria para Profissionais que necessariamente precisam de visão binocular ( como pilotos de avião, motoristas de ônibus, caminhão e carreta, por exemplo ), mas o reconhecimento da visão monocular como deficiência, no âmbito federal, geraria amplos gastos ao Governo e à Previdência Social, possibilitando aposentadoria a pessoas com nítida capacidade laboral, além de privilégios como acesso a todos os portadores de visão monocular a direitos já assegurados às pessoas com efetiva deficiência visual, como a reserva de vagas em concurso públicos e na chamada “ Lei de Cotas “, que determina a contratação de percentuais variados de pessoas com deficiência pelas empresas, proporcional ao número de funcionários.